Para onde vamos?

Pico do Baepi, um dos símbolos de Ilhabela.

Em filosofia chama-se de consciência aquela capacidade de saber de onde viemos e, com base nesse conhecimento, saber exatamente para onde vamos. Em outras palavras, ter consciência consiste em ter uma memória saudável e saber utilizá-la para, hoje, fazer os ajustes necessários em nossa trajetória de vida. É a consciência, portanto, que conecta os três tempos que compõem a realidade.

Numa cidade as coisas não são diferentes. Qualquer ação que interfira no conjunto da cidade, na forma como seus habitantes interagem ou em seu desenvolvimento depende, é claro, da forma como sua história, seus atributos e seus patrimônios são levados em conta. Se isto pudesse ser resumido com uma expressão, eu a chamaria de «consciência urbana».

Diferentemente da consciência humana, a «consciência urbana» não se limita a uma única pessoa. Por mais simples que seja uma ação e por mais concentrado que esteja o poder — público ou privado — várias pessoas estão envolvidas na tarefa de tornar as decisões e as ações conscientes. É neste ponto que todos os problemas de uma cidade se iniciam.

A democracia colocou a ignorância e a estupidez no poder; crimes passaram a ser tolerados; vítimas passaram a ser responsabilizadas pelos atos de seus detratores, que passaram a ser perdoados como vítimas do «sistema»; a história deste país fez as expectativas despencarem. Na escala reduzida de uma cidade como Ilhabela, isto significa aceitar com complacência e até certa alegria o fato de que líderes políticos, intelectuais e empresariais — pessoas teoricamente imbuídas da responsabilidade de conduzir a cidade na melhor direção — demonstram não ter a mais mínima idéia do que acontecerá nos próximos 10 ou 20 anos. É surpreendente que aceitemos ser conduzidos por tais pessoas, que lhes atribuamos alguma autoridade e que, ao mesmo tempo, as dispensemos de responder perguntas tão simples como «para onde vamos?». Isto se torna ainda mais surpreendente quando lembramos que a resposta a esta pergunta já está dada: estamos seguindo fielmente a linha que foi traçada nas últimas quatro décadas.

Neste período, o único «ponto fora da curva» foi a criação do Parque Estadual. É curioso constatar que quem mais fez em benefício de Ilhabela nestas últimas décadas foi uma pessoa que aparentemente não tinha responsabilidades diretas para com o município: José Pedro de Oliveira Costa, professor doutor da USP, que em 1976 teve a idéia de criar um Parque Estadual no arquipélago. De todas as pessoas que influenciaram a vida nesta cidade, só ele parecia saber exatamente para onde estávamos indo. Quem, hoje, é capaz de entender Ilhabela como o ilustre professor compreendeu?

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Artigo publicado no jornal Canal Aberto em 24 de fevereiro de 2011. Link da imagem.

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